Este é um dos poemas que mais gosto de GARY SNYDER, um dos que não me canso de ler e reler e tentar traduzir. É do seu primeiro livro, Riprap. Data da metade dos anos 50, quando o ecologista-beat-monge zen trabalhava de vigia florestal (atento para incêndios) num posto de observação no alto da montanha Sordough, no estado de Washington (extremo noroeste dos EUA). É de uma clareza e economia impressionantes, ao retratar o sublime banal da cena. Snyder executa de maneira inédita, nos EUA, dos ensinamentos zen-budistas, da poesia oriental, e também da "apresentação direta" e os preceitos imagistas de Pound, Williams, potencializada aqui por um "aprendiz de feiticeiro" (para tomarmos aqui o termo de Murilo Mendes). Simplicidade diante do majestoso: a paisagem abismal das montanhas. O "Eu" não é mais o protagonista, mas mais uma consciência, um ser vivo entre outros, atenta aos mais profundos ensinamentos da natureza. O poeta um detetive que aspira traduzir as pistas do real em verdades portáteis. Uma caneca de folha de flandres. A fumaça e a névoa montanha abaixo. A coragem simples e alegre de quem não tem nada a perder, apenas a aprender. A coragem de fazer a poesia dizer.
Vigia na Montanha Sourdough em meados de agosto
Vale abaixo neblina fumaça
Três dias de mormaço, depois de cinco de chuva.
Resina reluz nos pinhões.
Entre rochedos e campinas
Enxames de moscas novas.
Não consigo lembrar de coisas que já li
Alguns amigos, mas estão nas cidades.
Bebendo água fria de neve numa caneca
Mirando milhas lá embaixo
Pelo ar alto parado.
Mid-August at Sourdough Mountain Lookout
Down valley a smoke haze
Three days heat, after five days rain.
Pitch glows on the fir-conesAcross rocks and meadows
Swarms of new flies.
I cannot remember things I once read
A few friends, but they are in cities.
Drinking cold snow-water from a tin cup
Looking down for miles
Trough high still air.
GARY SNYDER
Tradução: Rodrigo Garcia Lopes
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