domingo, abril 29, 2007

Entrevista com NOAM CHOMSKY (na "Folha de São Paulo" de hoje)



Erro de gramática

Um dos intelectuais mais influentes hoje, Chomsky critica a dimensão midiática que "o caso dos pirahãs" teve, após ser publicada no "New Yorker", e critica a "paranóia do indivíduo" na web


RODRIGO GARCIA LOPES
ESPECIAL PARA A FOLHA


Nos últimos anos, sobretudo no pós-11 de Setembro, Noam Chomsky tem sido cada vez mais requisitado para palestras e conferências pelo mundo como um dos principais opositores da hegemonia americana.
Aos 78 anos, autor de mais de 40 livros, Chomsky é o principal dissidente de uma cultura dominada, como ele mesmo definiu, pela "manufatura do consentimento". Polêmico, é persona non grata na mídia americana, atraindo acusações de antiamericanismo e anti-semitismo, além de receber severas críticas da direita.
O ativismo político, no entanto, costuma desviar a atenção para o importante fato de que se trata não só de um dos grandes pensadores de nosso tempo mas de um renomado lingüista, cuja teoria da linguagem universal teve enormes influências nos estudos lingüísticos.
Recentemente, sua teoria foi envolvida em grande polêmica devido a estudos feitos por um ex-discípulo, Daniel Everett, e suas descobertas a partir da língua dos índios brasileiros pirahãs -que refutam a teoria chomskiana da linguagem humana universal [leia texto na outra pág.].
Numa tarde de neve em Cambridge, Chomsky nos recebeu em seu escritório no MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), onde é professor há 52 anos. Nesta entrevista, ele fala da controvérsia recente, de literatura, internet, da situação no Iraque e da democracia americana.


FOLHA - O sr. acredita que a recente pesquisa sobre os pirahãs, feita por Daniel Everett, desautoriza sua teoria de uma linguagem universal? Por quê?

NOAM CHOMSKY - Evidentemente, existem muitas confusões sobre a gramática universal. Em seu sentido moderno, o termo se refere à teoria correta da faculdade humana da linguagem, o que quer que isso venha a ser.
A gramática universal tem tanto status quanto a teoria correta do sistema visual humano, o que quer que isso venha a ser.
Não é "minha teoria". Nem se pode chamar de uma teoria. É um tópico, e há muitas propostas sobre qual deveria ser a teoria correta, constantemente se desenvolvendo, como no estudo do sistema visual ou de qualquer outra parte da ciência.
Não há uma controvérsia sensível sobre a existência da gramática universal, assim como não há sobre a teoria correta do sistema visual. Nos dois casos, como em toda a ciência, existem muitas questões sobre quais são as teorias corretas. Não há nada para ser "desautorizado".
Nós todos reconhecemos que existe uma faculdade humana para a linguagem -que existe alguma diferença biológica com relação à linguagem entre uma criança e um gato e um chimpanzé ou um pássaro canoro, por exemplo. Everett naturalmente concorda com isso.
Mas ele também afirma ter refutado a gramática universal. Isso significaria que ele refutou a crença de que existe uma teoria correta sobre as capacidades humanas, que ele concorda existirem. É difícil extrair algum sentido a partir dessa posição.
Tão logo essas confusões sejam esclarecidas, a única questão que restará é se as recentes afirmações de Everett sobre a língua pirahã estão corretas -a mesma questão que vem à tona em relação a qualquer outro trabalho em linguagem e cultura.
Há, de fato, um estudo cuidadoso feito por Andrew Nevins, David Pesetsky e Cilene Rodrigues argumentando detalhadamente que a língua pirahã, embora seja interessante (como são todas as línguas), não é menos incomum do que outras línguas conhecidas.
Se a língua pirahã acabou revelando características incomuns (assim como as de muitas línguas, como o inglês, por exemplo), então a gramática universal teria que ser modificada para acomodá-las, da mesma forma como ela está sendo constantemente modificada para dar conta de novas descobertas sobre outras línguas, inclusive outras que são estudadas de modo mais amplo.
A situação, novamente, é bem parecida com a que acontece no estudo do sistema visual ou outros sistemas orgânicos.
O que é incomum sobre a língua pirahã é a campanha de relações públicas que tem sido promovida em relação a ela, e a confusão que tem gerado.


FOLHA - Para chegar a sua teoria da gramática universal, o sr. fez pesquisa de campo, como Everett? Como o sr. chegou a suas conclusões sobre a existência de uma linguagem
universal?

CHOMSKY - Como todo mundo que se preocupa com a gramática universal, usei evidências de uma ampla variedade de línguas. Que outra alternativa poderia haver?
De fato, meu próprio departamento no MIT tem sido um dos grandes centros internacionais de pesquisa, inclusive em pesquisa de campo substancial, sobre uma ampla variedade de línguas do mundo -fatos esses bem conhecidos entre lingüistas profissionais.
Muitas pesquisas de campo têm sido feitas por excelentes lingüistas no Brasil e em muitas outras partes do mundo. Repito, parece haver uma confusão sobre esse assunto. Minhas conclusões sobre a existência de uma gramática universal -quer dizer, a existência de uma teoria correta da faculdade lingüística humana- são meros truísmos.
Se essa faculdade não existe, então a aquisição lingüística é um milagre. Se ela existe, então não há razão para duvidar de que exista uma teoria correta sobre sua natureza.

FOLHA - Em entrevistas, raramente o sr. fala de literatura. Uma das poucas observações é a de que "não é improvável que a literatura sempre vá render insights mais profundos para aquilo que é chamado de "a pessoa humana plena" do que qualquer método de investigação pode esperar conseguir". Poderia comentar isso?

CHOMSKY - De um lado, esse comentário é sobre quão pouco se sabe sobre o ser humano, sob qualquer ponto de vista, como o científico. Os assuntos humanos são complexos demais para que a ciência seja capaz de dizer muito sobre eles. As ciências sociais são úteis, mas não podem penetrar muito fundo.
O outro lado da questão é que a literatura e as artes freqüentemente oferecem insights penetrantes sobre como é o ser humano, como ele se comporta, como são suas inter-relações, que tipo de problemas ele enfrenta e assim por diante.
Mas esses insights não provam nada, só nos revelam coisas que podemos entender intuitivamente tão logo as percebamos. É por isso que eles são freqüentemente tão pungentes e têm tanto efeito sobre nós.

FOLHA - O sr. é autor de uma frase famosa e que já rendeu muita discussão: "Idéias verdes incolores dormem furiosamente". Qual é sua opinião sobre poesia, enquanto lingüista?

CHOMSKY - É claro que a poesia tem uma enorme importância, e é por isso que encontramos alguma forma de poesia em toda cultura e tradição que se conhecem: de tradições orais, que datam de milhares de anos, até a poesia moderna e experimental, a poesia se encontra em toda parte.
Ela pode ser feita de modo brilhante e efetivo. Esse verso, em particular, foi mal entendido, e foi só um dos muitos exemplos que dei: era um exemplo porque, simultaneamente, refutava algumas teorias dominantes sobre o que torna as frases gramaticais.
Uma teoria é a de W.V. Quine [1908-2000], talvez o filósofo anglo-americano mais influente da era moderna. Para ele uma frase seria gramatical se tivesse sentido.
Mas, veja, você tem que ter cuidado ao afirmar isso. Outros, como o novelista e filósofo Michael Frayn, interpretaram isso erroneamente.
Ele apontou de modo bastante correto que você não pode dar sentido para isso, mas para tudo pode se dar um sentido. Para qualquer série de palavras pode se atribuir um sentido.
Se você inverter a ordem da frase, "Furiosamente dormem verdes incolores idéias", você pode atribuir um sentido para ela também. Por esse critério, tudo seria gramatical.
Mas Quine está falando de sentido literal, e neste caso nenhuma das duas frases tem sentido literal, mas uma é gramatical, e a outra não.
De fato, a poesia joga com isso: um de seus principais procedimentos, discutido há 50 anos por William Empson [1906-84], em seu livro "Seven Types of Ambiguity" [Sete Tipos de Ambigüidade], é justamente tentar lutar contra as leis gramaticais, criar uma tal concisão de expressão que force o leitor a completar o sentido.

FOLHA - Quase 20 anos depois da publicação de "Manufacturing Consent" [manufatura do consentimento], o sr. acredita que o modelo de propaganda e de controle da mídia, desenhado pelo sr. e por Edward Herman, ainda está operante? Como o sr. vê o advento da internet e sua função de oposição neste novo contexto?

CHOMSKY - Bem, na versão de 2002 nós atualizamos e ampliamos nossos exemplos. Não podíamos falar nada da internet porque simplesmente ela não existia em 1988.
A internet é um desenvolvimento interessante, o que é complicado. É útil para pesquisa, há muito a ganhar com o acesso fácil a um amplo espectro de informações que competem entre si, para realizar pesquisas que antes dariam muito trabalho. Não estamos mais tão limitados à mídia convencional, isso é extremamente valioso. E ela também é uma tremenda ferramenta para a organização, para o ativismo. Claro que a mídia não apoia o ativismo que conflite com os centros de poder. Toda a atividade ativista hoje está organizada em torno da internet. A internet tem um efeito democrático mas, por outro lado, facilita, de modo espantoso e negativo, o surgimento de comportamentos de seita. Uma das coisas boas é que você pode colocar o que quiser. Mas algumas coisas estranhas podem acontecer. Supomos que eu faça um blog e coloque algo que vem a minha mente agora, que George Bush está colocando veneno nos reservatórios de água no Irã. Isso veio à minha cabeça e eu publico ali. Então outra pessoa lê e acredita e aumenta essa idéia, “é, e estão colocando no Brasil também, e no Paquistão”. É como a paranóia do indivíduo, se você já viu alguém que sofre de paranóia, eles têm resposta para tudo. E é assim que seitas se formam e se desenvolvem, e elas existem e são bem perigosas. Elas prejudicam as pessoas envolvidas, tiram a atenção a energia de outros problemas, mais sérios e urgentes. Existem exemplos reais disso, não estou inventando. A internet facilita o surgimento deste tipo de comportamento de seita, que é uma coisa para ser observada. Naturalmente, sabemos que esforços estão sendo feitos, por parte das poderosas mídias corporativas, para controlar a internet, para que elas tenham certeza de que ela sirva seus próprios propósitos e não os da democracia popular. Mas isso não é uma coisa fácil de se fazer, não acharam uma maneira de bloquear a internet, mas certamente estão trabalhando nisso. Suponha que eu queira ler na internet o New York Times de hoje. Bem, a primeira coisa que aparece são pilhas de propagandas, pop-ups, há muitos dispositivos estabelecidos que são usados para levar você para algumas direções, e muita energia está sendo colocada nisso. Se você sabe o que está procurando você encontra com uma pesquisa apropriada, mas se você for um usuário inocente, vai ser levado para todo tipo de propaganda, propaganda do estado ou corporativas, ou pornografia, ou outras coisas. A internet tem um enorme potencial, e claro que o poder concentrado sabe disso e está tentando controlá-la. E claro que há uma luta agora para manter a internet realmente livre e aberta.
É uma arena muito viva de controvérsia e conflito também.

FOLHA - Como consertar o estrago feito pela administração Bush, em termos de políticas internas e exteriores? Se o Iraque foi um teste para "a grande estratégia imperial de Bush", como o senhor escreve, quais seriam os resultados?

CHOMSKY - Este é um exemplo interessante do modo como a propaganda funciona. A técnica básica, o princípio básico desse sistema sofisticado de propaganda, é não articular a agenda do partido político. Se você articulá-la, ela se torna óbvia demais e as pessoas não vão acreditar. É uma coisa que ocorre nas ditaduras militares, anunciar a agenda do partido, dizer que as pessoas acreditem ou terão problemas. Então, o modo mais sofisticado de fazer isso, como no caso do sistema americano, é pressupor a agenda do partido político. Você não articula, é só a suposição dentro da qual o debate acontece. Então você encoraja um debate vigoroso, mas desde que ele fique dentro da moldura daquela suposição. Isso não só dá a impressão de liberdade, mas também fortifica a agenda do partido político, porque ela só está pressuposta, é como o ar que se respira, não é questionada. Há um grande debate acontecendo com relação ao Iraque: os EUA podem atingir seus objetivos? Não há debate sobre se os EUA deveriam atingir seus objetivos. Isso é tido como certo, é algo pressuposto, é óbvio que os EUA deveriam atingir seus objetivos. Ou será que os métodos de Bush é que estão errados? A administração Bush tem sido condenada por não estar atingindo seus objetivos, por ter fracassado. É um pouco como a crítica que existia dentro da Alemanha nazista depois de Stalingrado, quando os generais ficavam criticando Hitler por causa de seus erros estúpidos. Se a proposta atual de Bush, que provavelmente vai aumentar as tropas em torno de 50 mil soldados, funcionar, haverá aqueles que vão elogiar a sabedoria do governo americano por sair do Iraque deixando para trás uma terra de destruição e ruína, mas tendo atingido seus objetivos. É dramático observar como o novo aumento de tropas acompanham, de modo previsível, o aumento da propaganda sobre a interferência iraniana no Iraque, este debate vigoroso sobre se o Irã está interferindo no país. Bem, esta discussão só é possível partir de uma suposição: a de que os EUA são os donos do mundo. Se são os donos do mundo, então não estão interferindo no Iraque. Se os EUA invadem o Iraque, se centenas de milhares de pessoas são mortas e se o país é destruído, não há nada de errado nisso porque os EUA são os donos do mundo. Se não aceitamos este debate, como muita gente, ele se torna ridículo. O que quer que os EUA façam seria necessariamente certo, cheio de boas intenções, talvez tenham cometido erros, feito coisas criminosas, mas o princípio que sublinha isso é esse, o de que os EUA são os donos do mundo. Mas esta questão não pode ser levantada nos EUA, ou mesmo no ocidente. Temos supostamente que acreditar que os EUA invadiriam o Iraque mesmo se eles produzissem tomate e alface e o centro da produção de petróleo fosse no Pacífico Sul? É difícil de acreditar, mas esta é quase suposição na propaganda ocidental. Não existe debate sobre isso. Então, se alguém questionar se a invasão não tem a ver com o fato do Iraque ter a segunda reserva de energia mundial e de estar localizado bem no coração do centro produtor de energia do mundo, é acusado de formular teoria de conspiração, de ser paranóico, marxista.

FOLHA - E por que os EUA não se retiram do Iraque?

CHOMSKY - Por razões óbvias, eles criaram uma imensa catástrofe. Eles sabem perfeitamente, segundo suas próprias pesquisas, que a maioria esmagadora dos iraquianos quer que as forças estrangeiras abandonem o país imediatamente. Mas isso não é uma opção: as opiniões dos iraquianos não interessa. O que interessa é o que o poder dos EUA quer alcançar. O maior objetivo é estabelecer como cliente um regime estável, com bases militares e corporações estrangeiras, sobretudo britânicas e americanas, explorando o petróleo. Os EUA vão fazer o possível para prevenir que o Iraque se torne uma democracia soberana, mesmo que moderada, porque isso seria catastrófico! Isso seria um passo para os EUA perderem o controle das principais fontes de recursos do mundo. Talvez eles sejam forçados a isso, mas será uma batalha. Se o Iraque se tornar soberano e minimamente democrático, provavelmente terá a maioria xiita, que seria com certeza influente. Depois os xiitas iriam se mexer para melhorar as relações com o Irã, o que já estão fazendo. Há uma grande população xiita do outro lado da fronteira, na Arábia Saudita, sendo amargamente reprimida. O que ocorre é que a maior parte do petróleo fica em regiões dominadas pelos xiitas. Imagine a probabilidade de uma ampla coalizão xiita controlando a maior parte do petróleo do mundo, independente dos EUA e provavelmente gravitando cada vez mais em direção a outros países do grupo asiático, e com o Irã provavelmente se tornando um membro também. Se qualquer dessas coisas acontecer os EUA virariam uma potência de segunda classe. Mas, na maioria das vezes, não se permite que se discuta isso. As perguntas principais não são levantadas, não é permitido. Isso é propaganda sofisticada.


FOLHA - Apesar de sua crítica dura à política externa americana, o sr. constantemente repete que os EUA são a sociedade mais livre e democrática que existe. Como pode um país onde as eleições são literalmente "compradas", onde se observa um controle maciço da opinião pública por meio da manipulação da mídia e onde o governo, especialmente depois do 11 de Setembro, aumenta a vigilância sobre seus cidadãos e restringe as liberdades civis, ser chamado de uma democracia?

CHOMSKY
- Mesmo com tudo isso, por padrões comparativos e históricos, os EUA são o país mais livre do mundo.

Pegue o exemplo do Reino Unido: há uma vigilância extrema lá, bem maior do que nos EUA, com câmeras por toda parte, vendo tudo o que as pessoas fazem. Lá existem leis de calúnia e difamação que são severas infrações à liberdade de expressão, leis que seriam inconcebíveis nos EUA.
Outro exemplo: o governo britânico criou uma comissão para investigar se a [rede] BBC estava sendo crítica demais ao governo. O que não foi debatido foi o fato de a comissão existir, em primeiro lugar. Nos EUA seria impossível pensar numa comissão para decidir se a CBS está sendo crítica demais.
Por padrões comparativos, o governo americano tem poder limitado para coagir a liberdade de expressão. Bush está tentando fazer um país mais totalitário, e ele tem feito progressos, infelizmente, mas o governo ainda tem um poder limitado.
Mesmo a liberdade de expressão hoje está sob forte proteção desde os anos 1960, na esteira dos movimentos dos direitos civis. Mas você tem toda razão quando diz que as eleições não só são compradas, mas vazias, mais parecidas com comerciais de TV, e outros países estão seguindo esse modelo.
As eleições, cada vez mais, são uma questão de criar ilusões e imagens pela indústria da propaganda -como se [o político] fosse uma mercadoria- e manter as pessoas longe dos temas importantes, do que é relevante.
Pois a população se opõe aos dois partidos, e isso elimina muito do conteúdo das eleições.
Isso nos leva à questão do controle das idéias, que é sempre ruim, mas não é uma sala de tortura. É melhor enfrentar um comercial enganoso do que uma sala de tortura -lembremos do que aconteceu recentemente no Brasil.



RODRIGO GARCIA LOPES é autor de "Vozes e Visões - Panorama da Arte e Cultura Norte-Americanas Hoje" (Iluminuras) e professor do departamento de línguas românicas da Universidade da Carolina do Norte, em Chapell Hill.


Pensador revolucionou a linguística

DA REDAÇÃO

Noam Chomsky é um dos principais ativistas de esquerda americanos e criador da teoria da gramática transformacional (às vezes chamada gerativa ou transformacional-gerativa), que revolucionou os estudos da linguagem.
Nascido em 1928 na Filadélfia, é a personalidade viva com mais citações no Índice de Citações de Artes e Humanidades entre 1980 e 1992, além de ser autor de mais de 40 livros e mil artigos.
Em seus estudos sobre o fenômeno lingüístico, Chomsky explora as fronteiras filosóficas e epistemológicas da linguagem. Para ele, a linguagem é um fenômeno biológico e pode ser estudada a partir de uma perspectiva internalista, ou seja, como fenômeno psicológico -retirando-se a ênfase em seu estudo como manifestação intersubjetiva e social.
A tese de seu discípulo Everett, que viveu sete anos com os pirahãs, sobre como a chamada "experiência imediata" limita a competência lingüística desses índios, saiu do domínio acadêmico e se espalhou na imprensa.
A reportagem de 20 páginas ("O intérprete - Será que uma tribo remota da Amazônia virou do avesso nossa compreensão da linguagem?") publicada em 16/4 na revista "New Yorker" foi citada por jornais on-line e blogs nos EUA e no Brasil.

quarta-feira, abril 25, 2007

CHEGANDO NA ESTAÇÃO AQUI


De alguma coisa agora quase se lembrava, mas de tocar o que estava mais perto, e modular o pensamento para o mais distante monumento: os sistemas salpicados sobre a mesa negra e circular.


Esta é a estação Aqui, a quinta do ano, a única com estação de esquis que são os esquisitos velozes emblemas na neve e a foto do deserto sobre a mesa neste momento.


“Os nomes não nomeiam mais as coisas, as coisas se afastaram e deixaram para trás branca paisagem, e te deixaram num quarto escuro, de onde você nunca mais vai voltar”.


Não, estar perto é conhecer a distância, e estar longe é se esquecer. A caminho, sem ainda ter voltado. O ar corta as narinas. isso agora parece não se mover, não tanto quanto um impulso sem forças para lutar contra as margens suadas quando se desligam enquanto damos um gole de áraque, e na tela-ilha tropical do cassino.


A natureza nos desconstrói sem que notemos, e a noite restaura a memória das percepções que usaremos, no dia seguinte, para reconstruir a natureza e a nós mesmos.


Registrar isto, e o modo pelo qual eu poderia tocar esta realidade e seu impacto sobre minha consciência com mais intensidade. Eu podia usar as palavras como uma câmera, ou como um passaporte para a dimensão do aqui-e-agora, nossa própria consciência em movimento, seguindo aquele pássaro, de galho seco a galho nevado. Registrar que agora sei do poder de todas as coisas serem, cinema.


Nesta estação, temos um corpo, e é por termos um corpo que isto existe e respira, o que nos iguala a insetos e árvores, ligados em seu presente imediato.


Quanto mais rápido amanhece, mais devagar anoitece.


A relva foi capaz de ativar a relva do meu cérebro para perdurar. Ou seja, ouça seus ossos enquanto escuta os estalos do fogo.


Hálito era o nome para gente, e fala-hálito o nome que se dava quando gente e hálito eram um .


Nos encontramos tão longe, paisagens somem sob nossos pés, uma viagem que se faz parado, diante da casa antiga, cavando um espaço em você, um copo caindo no espaço, sombra em sua nuca, vitória efêmera sobre o silêncio. Mas a música voltou e se lembrou. Os poemas brancos sobre a mesa negra, os sistemas e galáxias em cima. Os outros virão para te pegar.






quinta-feira, abril 19, 2007

Entrevistas 2007



Mês passado fui para Nova Iorque, Providence e Boston, onde comecei um segundo livro de entrevistas com personalidades norte-americanas. O primeiro foi
Vozes & Visões, entrevistas que fiz em de 90 a 92 com John Cage, William Burroughs, Allen Ginsberg, Roy Lichtenstein, Chick Corea, Nam June Paik, Amiri Baraka, Charles Bernstein, Marjorie Perloff, John Ashbery, entre outros. Saiu pela Iluminuras em 1996, e acho que está esgotado).

Para este segundo projeto, entrevistei Eliot Weinberger, maior tradutor de Octavio Paz nos EUA , excelente ensaísta e crítico dos EUA (um de seus livros saiu recentemente no Brasil pela Record), Forrest Gander, ótimo poeta da nova geração, o jornalista endiabrado e "dissecador da mídia" Danny Schechter, e o grande linguista e crítico da mídia e do governo americano Noam Chomsky. Aqui estamos no seu escritório no MIT, em Cambridge, tendo ao fundo um de seus gurus, Bertrand Russell, enquanto uma tempestade de neve se arma lá fora.

Também entrevistei o escritor e crítico Andrei Codrescu e a crítica Marjorie Perloff. Os próximos da lista são os músicos Pat Metheny, Keith Jarret e a crítica Camile Paglia.

E ontem voltei de Hickory, na Carolina do Norte, onde fui entrevistar o poeta, ecologista, ensaísta Gary Snyder, que estava dando uma palestra numa faculdade local. Tentei entrevistá-lo em 1992, mas ele respondeu com um postal que mais parecia um koan zen: "Caro Rodrigo, infelizmente não dou mais entrevistas".
Snyder é um dos grandes poetas americanos e um dos poucos do grupo original da beat generation que ainda está vivo. Foi uma aula e uma grande emoção ouvi-lo falar de ecologia, "América", etnopoesia, Zen, de sua amizade com Jack Kerouac, natureza, poesia, haiku e poesia chinesa, entre outros assuntos. Ele está com 77 anos, mas continua em ótima forma, com inteligência e humor aguçadíssimos. São encontros assim que fazem a vida fazer um pouco de sentido.

sábado, abril 14, 2007

Trecho inicial de "Canção de Mim Mesmo", de WALT WHITMAN

de SONG OF MYSELF / CANÇÃO DE MIM MESMO

(A obra-prima de Whitman e da poesia de todos os tempos, um dos poemas mais longos da língua inglesa)






EU CELEBRO a mim mesmo,
E o que eu assumo você vai assumir,
Pois cada átomo que pertence a mim pertence a você.

Vadio e convido minha alma,
Me deito e vadio à vontade . . . . observando uma lâmina de grama do verão.

Casas e quartos se enchem de perfumes . . . . as estantes estão lotadas de perfumes,
Respiro o aroma eu mesmo, e gosto e o reconheço,
Sua destilação poderia me intoxicar também, mas não deixo.

A atmosfera não é nenhum perfume . . . . não tem gosto de destilação . . . . é
inodoro,
É pra minha boca apenas e pra sempre . . . . estou apaixonado por ela,
Vou até a margem junto à mata sem disfarces e pelado,
Louco para que ela faça contato comigo.

A fumaça de minha própria respiração,
Ecos, ondulações, zunzuns e sussurros . . . . raiz de amaranto, fio de seda, forquilha e videira,
Minha respiração minha inspiração . . . . a batida do meu coração . . . . a passagem do ar e do sangue
pelos meus pulmões,
O aroma das folhas verdes e das folhas secas, da praia e das rochas marinhas escuro-coloridas, e do feno no celeiro,
O som das palavras baforadas por minha voz . . . . palavras disparadas nos redemoinhos
do vento,
Uns beijos de leve . . . . alguns amassos . . . . o afago dos braços,
Jogo de luz e sombra nas árvores enquanto oscilam seus galhos sutis,
Delícia de estar só ou no agito das ruas, ou pelos campos e encostas de colina,
Sensação de bem-estar. . . . trinado de meio-dia . . . . a canção de mim mesmo se erguendo da cama
e cruzando com o sol.


Você pensou que mil acres eram um exagero ? Pensou que a terra um exagero ?
Já praticou bastante até aprender a ler ?
Já sentiu orgulho de entender o sentido dos poemas ?

Fique este dia e esta noite comigo e você vai possuir a origem de todos os poemas,
Vai possuir o que há de bom na terra e do sol . . . . sobraram milhões de sóis por aí,
Nada de pegar coisas de segunda ou de terceira mão . . . . nem de ver através
dos olhos dos mortos . . . . nem de se alimentar dos espectros nos livros,
E nada de olhar através dos meus olhos, nem de pegar coisas de mim,
Você vai escutar todos os lados e filtrá-los a partir de seu eu.

Ouvi o que os falantes falavam . . . . a fala do começo e do fim,
Mas não estou falando nem de fim nem de começo.

Nunca existiu mais começo do que este agora,
Nem mais juventude nem era do que esta agora ;
Nem vai existir mais perfeição do que já existe agora,
Nem mais céu ou inferno do que existe agora.

Pressa e pressa e pressa,
Sempre a pressa criativa do mundo.

Da obscuridade avançam opostos iguais . . . . Sempre substância e crescimento,
Sempre um nó de identidade . . . . sempre diferença . . . . sempre uma espécie de vida.

Inútil ficar preso nos detalhes . . . . Tanto eruditos quanto ignorantes sabem que é assim.

Certo como a certeza mais certa . . . . aprumado na vertical, bem trançado, firme nas vigas,
Forte como um cavalo, carinhoso, orgulhoso, elétrico,
Aqui estamos eu e este mistério.

[.......]



TRADUÇÃO DE RODRIGO GARCIA LOPES
,
DO LIVRO FOLHAS DE RELVA / Leaves of Grass (Iluminuras, 2004)

quinta-feira, abril 12, 2007

Outro inédito de SATORI USO




passando a lanterna

de mão em mão

noite de inverno




sexta-feira, abril 06, 2007



Repórter: "Por que você não escreve do jeito que fala?"

Gertrude Stein: "Por que você não lê do jeito que escrevo?"






quinta-feira, abril 05, 2007




“A realidade é aquilo que não desaparece quando se deixa de acreditar nela.”

Philip Dick