quarta-feira, janeiro 16, 2008

UM POEMA PARA O DESERTO


com seus rios secos desde o começo
com sua sede sonora
com o sal que não pergunta

do sentido

deste paraíso perfeito
templo sem vozes
do sol que se deita

olho de um sábio egípcio
um oásis
onde o céu
se amplia e revela
uma íris, ou quase,
e a metade da lua
magnifica
uma lágrima minha
fixando
o som misterioso das montanhas
a respiração dessas rochas e pessoas

automóveis deslocando seus vazios
sob o fog azul da luz no sul
o trânsito pesado e veloz
o stress das consoantes

o desdobrar da seda
o cheiro do fumo e de café africano

sensação imprecisa, pedra preciosa
que celebra
a tarde que dura, suprema,

em sua dimensão paralela

o mar invisível que se quebra
manso
aqui
onde não há água.
Não há margens, nem miragens.
Mas cedo ou tarde descobrimos
o que este outono

tem para nos dizer:
tempo de se desfolhar
-- cores, peles, percepções --

tempo de silêncio
flutuando agora no ar

fazendo

bolhas na superfície

de um céu que é mais além.



Tempe, Arizona, agosto de 1990


Em Visiblia (Iluminuras, 1994)

Nenhum comentário: