quinta-feira, julho 30, 2009

PARA SUA TÍMIDA SENHORA, de ANDREW MARVELL, traduzido por Rodrigo Garcia Lopes

Este poema é um dos meus favoritos quando o tema é carpe diem (curta a vida que a vida é curta). Segue uma tradução feita por esses dias, respeitando ao máximo as rimas do original.



Com mundo e tempo de sobra, acredite-me,

Senhora, essa tua timidez não seria crime.

Sentados, pensaríamos no modo melhor

De gozar nosso longo dia de amor.

Tu pelas margens do Ganges

Acharia rubis, eu, no estuário langue

Do Humber, reclamaria de tudo.

Te amaria dez anos antes do Dilúvio,

E tu, se quisesses, recusarias meu eu

Até a conversão dos Judeus.

Meu amor vegetal iria assim crescendo

Mais vasto que impérios, e mais lento;

Cem anos gastos para elogiar

Teus olhos, e tua testa contemplar;

Duzentos para adorar cada seio,

Mas trinta mil para seu recheio;

Uma era ao menos para cada seção,

E a última exibiria enfim seu coração.

Senhora, bem mereces tal status.

Recusaria te amar por mais barato.


Mas ouço às nossas costas de repente

O carro alado do tempo, rente;

E além de nós ardem na tarde

Desertos de vasta eternidade.

Tua beleza, hoje, amanhã não será,

Nem na lápide marmórea há de soar

O eco dessa canção; só vermes sem piedade

A devorar tão protegida virgindade,

E tua honra antiquada virando pó,

E cinzas todo meu desejo, a sós:

A cova é discreta e confortável alcova,

Mas que amantes ali se abracem, não há prova.

Agora, enquanto a cor em suas maçãs

Pousa em tua pele como rocio da manhã,

E enquanto tua alma transpire de desejo

E em seus poros fogos sutis revejo,

Vamos nos acabar enquanto é de matina,

E já, como amorosas aves de rapina,

De uma vez devorar o nosso tempo

Em vez de enlanguescer em seu relento.

Enrolemos nossa força, sem espera,

Nossa ternura toda numa só esfera,

E rasguemos prazeres com luta ríspida,

Ao passar pelos portões de ferro da vida;

Pois, se não podemos o sol deter

Podemos ao menos fazê-lo correr.





ANDREW MARVELL, poeta metafísico inglês
TRADUÇÃO: RODRIGO GARCIA LOPES



segunda-feira, julho 27, 2009

UIVOS E APLAUSOS À RESISTÊNCIA

TRIBUNA CULTURAL

por Zema Ribeiro*



UIVOS E APLAUSOS À RESISTÊNCIA



Revista de literatura e arte, Coyote alcança 19ª. edição, nadando contra a corrente, remando contra a maré. Que editores e colaboradores consigam ir ainda mais longe, amém!


Thomaz Albornoz Neves entrevistou, em 1993, o poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto (1920-1999), no apartamento carioca do autor de Morte e vida Severina. Apenas uma pequena parte da conversa entre os dois foi publicada na revista Interpoesia, em 1998. O resto permanecia inédito. O 19º. número da Revista Coyote [Kan Editora, distribuição nacional: Iluminuras, 52 páginas, R$ 10,00, pedidos pelo http://www.sebodobac.com.br; alô, livrarias e sebos de São Luís: ninguém se interessa?] traz a íntegra da entrevista com o “cabra lírico”. E este é apenas um dos destaques da revista de literatura e arte que, só por conseguir resistir e chegar a esta 19ª. edição, já merece nossos uivos, digo, aplausos (que tal uivarmos batendo palmas?), pela resistência, insistência, perseverança e, mesmo, teimosia de seus editores.

Ademir Assunção (SP), Marcos Losnak (PR) e Rodrigo Garcia Lopes (PR), inventam e reinventam a publicação sediada em Londrina (PR) e que resiste bravamente, até aqui – e esperamos que por muito tempo ainda –, graças ao apoio do Programa Municipal de Incentivo à Cultura de Londrina. Engana-se quem pensa que, com isso, a revista se fecha no próprio umbigo e traz apenas poetas da terra de Leminski. Muito ao contrário: é na Coyote que conheço novas vozes nos campos a que se dedica a publicação (literatura e arte, convém lembrar) e (re-)leio vozes, não direi velhas – há coisas que simplesmente não envelhecem –, mas fundamentais.

Com um belíssimo projeto gráfico, a revista transpira qualidade da primeira à quarta capa: tudo ali é arte. A “matilha” da 19, além de João Cabral e seu entrevistador Thomaz Albornoz Neves, e do editor (da revista) Ademir Assunção – que brinda o público leitor com poemas inéditos –, apresenta nomes como George Oppen (poeta ianque do Grupo Objetivista, formado nos anos 30, falecido em 1984), Teo Adorno (quadrinista e ilustrador paulista) e Ernesto Sabato (doutor em física nuclear, um dos maiores nomes da literatura argentina, nascido em 1911), entre outros, além da tradicional quarta capa, ilustrada pelo Beto, já reconhecida como a capa dos “movimentos”.

TRECHOS DA COYOTE 19

“Tenho a impressão que, por um lado, sou muito mais visual que plástico, por outro não sou nada auditivo. Estou com Voltaire, a música é o menos desagradável dos barulhos. Eu não tenho o menor interesse por música. (...). Minha poesia é toda visual: ela se afasta da linguagem abstrata. A linguagem que me interessa é a linguagem concreta. Meu esforço é justamente, usando o título do livro de Paul Éluard, Donner a Voir [Dar a ver]”.

João Cabral de Melo Neto, em entrevista a Thomaz Albornoz Neves, em 1993

*

“luzes esverdeadas na tela/ da TV, pipocas de microondas,/ pipocos digitais, sim,/ olha lá, olha lá, santelmo/ riscado do mapa,/ cochabamba para bailar la bamba,/ titicaca não passa de titica,/ brasília era só uma ilha, cercada/ de cucarachas e carcamanos,/ quem vai sentir falta/ dessas baratas?, soca mais bombas/ na bunda dessa indiarada, pow,/ crash, soc, e que se fodam/ todos los hermanos, cambada/ de terroristas islâmicos,/ papai me disse que eles comem/ gente, vai vendo, e ainda usam as tíbias/ como palitos de dente”

Ademir Assunção, Videogame, da seleta de inéditos Boa noite, Mister Mistério

terça-feira, julho 21, 2009

CONTRACAPA COYOTE 20




Você já foi vítima de bala perdida?
Provavelmente não.
Mas, e de mala perdido? Provavelmente sim.
É aquele sujeito que, mal você bota o pé no bar, te localiza com seus olhos
predadores e já chega junto, geralmente puxando o saco
e uma carência afetiva maior que a baía de Hong Kong.
Foi pensamos neles que dedicamos a contracapa da últimas Coyote.
Idéia dos editores, desenho de BETO.

segunda-feira, julho 13, 2009

BUENO ESCREVE SOBRE A COYOTE NO ESTADO DO PARANÁ

As artes de Coyote

AS ARTES DE COYOTE

Ao final de cada estação do ano tenho a grata surpresa de receber em minha porta, gentil leitor, uma das mais bem elaboradas revistas de literatura e arte do Brasil, talvez única em seu gênero, que é a muito nossa Coyote. Fundada pelo impagável trio de poetas Ademir Assunção, Marcos Losnak e Rodrigo Garcia Lopes, em Londrina, a revista acaba de atingir a 19.ª edição, numa trajetória, até aqui, que a coloca como referência do jornalismo cultural feito no País.

Não poderia ser diferente com o número de outono, distribuído nacionalmente pela editora Iluminuras, desde meados de junho. Da capa à contra-capa, ainda outra vez, Coyote diz, alto e bom som, a que veio. Acho que gozo alguma autoridade para falar da matéria. Vivi, e sofri, epifanias e angústias, por mais de 8 anos, à frente do hoje legendário Nicolau, o premiado tablóide que aliado a uma brava e pequena equipe criamos cá no Paraná. Mesmo patrocinado pelo Governo, alcançamos disturbar a sempre morna cena cultural brasílica. E tornar Nicolau tudo, menos oficialesco! O que foi, convenhamos, uma rara proeza...

A cada edição de Coyote, que aqui recebo, e a recebo desde o número O, me surpreendo com sua invariável qualidade. Visível o desejo de fazer o novo, de surpreender o leitor, de nos dar, de uma forma generosa, o que há de melhor, sobretudo da cena literária - brasileira ou internacional.

Insisto sempre que jornalismo cultural tem que ser realizado por quem é do ramo - poetas, ficcionistas, críticos. Com algumas altas exceções, entre as quais destaco o meu amigo Alcino Leite Neto, um editor histórico, e que é exclusivamente jornalista. A ele devemos alguns dos grandes momentos do gênero cá na Terra de Vera Cruz. Exceção, repito. Ainda que haja, sim, outras e poucas.

Nesta Coyote outonal, não exagero, tudo são ouros. Entretanto, a entrevista, inédita, de João Cabral de Melo Neto, criteriosamente feita por Thomaz Albornoz Neves; o belíssimo Garrafa ao mar do futuro, da espanhola, radicada no Paraguai, Montserrat Alvarez, na preciosa tradução de Luiz Roberto Guedes e a safra de novos poemas de Ademir Assunção, esse incansável poeta-inventor, além da "punch-prosa" do americano Donald Barthelme, por Caetano Galindo, são os momentos máximos da edição.

E por último mas não menos importante, convém lembrar que Coyote não tem nem nunca teve editoriais. São, de um modo original e particularíssimo, substituídos por trechos, às vezes de uma só frase, de alguém, de qualquer tempo, que pensa a arte e a vida. Neste número, o editorial-epígrafe, comovente, é do quase centenário escritor argentino Ernesto Sábato. Só lendo, pra ver!

Wilson Bueno (12/7/2009) - O Estado do Paraná.

sexta-feira, julho 10, 2009

COYOTE EM PORTO ALEGRE


COYOTE 19 EM PORTO ALEGRE

EM PORTO ALEGRE

&

Bate-papo e leitura de poemas com

Ademir Assunção (editor), Fernando Ramos (Jornal Vaia)

Telma Scherer, Ronald Augusto e Cristina Macedo

dia 14/07 (terça-feira) - 19h

grátis

Palavraria

Rua Vasco da Gama , 165 - Bom Fim

Fone: (051) 3268-4260

Contatos> jornalvaia@gmail.com e 98923603


O poeta e jornalista Ademir Assunção vem à Porto Alegre para lançar a edição de número 19 da revista Coyote, na terça-feira, dia 14, às 19h, na Palavraria (rua Vasco da Gama, 165). O lançamento será precedido de um bate-papo de Ademir com os poetas Ronald Augusto e Telma Scherer, com mediação de Fernando Ramos, editor do jornal Vaia.

RODRIGO DE HARO

Rodrigo de Haro, pintor e poeta catarinense


"O tempo é um monarca sonolento"
Rodrigo de Haro

"O tempo é um lento monarca",
escreve Rodrigo, o de Haro,
sob o foco fugaz que a mão abarca
em ondas de mármore raro.

Os segundos são patriarcas
ou detetives munidos de faro:
segredos na cabala das arcas
sob sete selos, sete templários.

Na luz que o relógio não marca
No transe das folhas, fumaça dos carros,
"O tempo é um sonolento monarca",
Corrige Rodrigo de Haro.




quinta-feira, julho 02, 2009

Rodrigo de Souza Leão (1965-2009)

"Ainda sou o garoto do cachorro azul. Um azul enorme refletido agora no olho do garoto que achou no lixo o meu cachorro azul".

Acabo de saber por um amigo do Rio do falecimento do poeta e escritor

Rodrigo de Souza Leão (lincado no blog lowcura, ao lado),

de ataque cardíaco.

Há pelo menos dez anos nos comunicávamos por e-mail. Nos falamos por telefone algumas vezes. Uma vez, no Rio, liguei para combinarmos de nos encontrar mas acabou não acontecendo.

Rodrigo era um dos melhores escritores de sua geração, poeta de primeira

e que havia lançado no ano passado um livro literalmente bárbaro, Todos os Cachorros São Azuis.

Descanse em paz, xará.