AMORES BRUTOS
Que um beijo nos transe
Outro ser, além, nos dance
Onde a memória não alcance
O abismo do fim e seu lance.
Que este beijo não seja o bastante
Nem que me despedace
Olho do sol que franze
E que nos sangre
(O medo desse querer
Caminhos rompendo o éter
Da dor, polidor, refém
Do milagre de ser
Outra pessoa e alguém.)
Que química imita
A raiva do seu amor?
Que física duplica
Essa faísca de horror?
Que se apaguem
Nossos erros e motivos —
Toda lágrima consagre
Apenas estar vivo,
Este milagre.
(Em Nômada, Lamparina, 2004)