O
Globo.
Caderno
Prosa, 28.3.2015
Veracidade histórica em trama
sedutora
Episódio real e pouco conhecido sustenta
primeiro romance de Rodrigo Garcia Lopes
ELIAS
FAJARDO
Uma das principais características do
romance policial, desenvolvido principalmente na Inglaterra e nos Estados
Unidos a partir de 1930, é que o autor vai, ao longo do texto, distribuindo
pistas falsas com o objetivo de criar suspense e iludir o leitor sobre a
verdadeira identidade do criminoso. Rodrigo Garcia Lopes, poeta, compositor e
tradutor, emprega com rigor esta regra em “O trovador”, seu primeiro romance, e
a ela acrescenta uma rigorosa pesquisa histórica sobre a colonização do norte
do Paraná, um episódio intenso e interessante da nossa história recente. Tema
tratado também, aliás, pelo paranaense Domingos Pellegrini Jr. em “Terra
Vermelha” (Editora Leya).
A obra de Pellegrini Jr. é um romance
histórico que mostra com intensa dramaticidade como a mata virgem foi
avassaladoramente devastada para dar lugar ao plantio do café, e como os
personagens foram se transformando neste processo violento. “O trovador” tem o
mesmo cenário: a terra vermelha e farta onde as pessoas afundam no barro até os
joelhos, a paisagem agreste onde os crepúsculos são longos e melancólicos, e
também onde a ambição e a sedução do poder invadem a alma de ricos e pobres. A
peça chave do enigma proposto por Rodrigo Garcia Lopes é um poema do autor
provençal Arnaut Daniel, escrito num papel encontrado na boca de uma das
vítimas de uma série de assassinatos misteriosos.
A partir dos bastidores reais da década de
30 no Brasil e na Europa, “O trovador” desenvolve uma situação de ficção
envolvendo empresas, autoridades e até membros da corte inglesa, entre eles o
então rei Edward VIII da Inglaterra, simpatizante do nazismo e sócio de uma empresa
britânica colonizadora no norte do Paraná. Neste cenário e numa época em que as
comunicações não eram desenvolvidas como o são hoje, os personagens de ficção
Lord Lovat, presidente da companhia de terras, e o tradutor e intérprete Adam
Blake são enviados a Londrina para esclarecer a origem das mortes e a situação
financeira da empresa. O que eles encontram é uma verdadeira Babel sertaneja,
onde convivem e entram em choque etnias que vão dos europeus aos asiáticos, e
onde não param de chegar advogados, militares, médicos, burocratas, artistas,
fazendeiros, cientistas, agricultores e prostitutas vindos das regiões mais
longínquas, seduzidos pelo sonho do enriquecimento fácil no novo Eldorado
tropical.
Utilizando uma linguagem poética que
lhe permite, entre outras imagens, comparar o halo em torno da Lua com o centro
de uma pupila branca gigantesca, Rodrigo Garcia Lopes consegue sustentar por
mais de 400 páginas uma trama rocambolesca, e ao mesmo tempo nos informar, com
veracidade histórica, sobre um episódio ainda pouco conhecido no país.
Elias
Fajardo é autor dos romances “Ser tão menino”, “Aventuras de Rapaz” e “Belo
como um abismo”.