UM POEMA PARA O DESERTO
com seus rios secos desde o começo
com sua sede sonora
com o sal que não pergunta
do sentido
deste paraíso perfeito
templo sem vozes
do sol que se deita
olho de um sábio egípcio
um oásis
onde o céu
se amplia e revela
uma íris, ou quase,
e a metade da lua
magnifica
uma lágrima minha
fixando
o som misterioso dessas rochas e pessoas
automóveis deslocando seus vazios
sob o fog azul da luz no sul
o trânsito pesado e veloz
o stress das consoantes
o desdobrar da seda
o cheiro do fumo e de café africano
sensação imprecisa, pedra preciosa
que celebra
a tarde que dura, suprema,
em sua dimensão paralela
o mar invisível que se quebra
manso
aqui
onde não há água.
Não há margens, nem miragens.
mas cedo ou tarde descobrimos
o que este outono
tem para nos dizer:
— cores, peles, percepções —
tempo de silêncio
flutuando agora no ar
fazendo
bolhas na superfície
de um céu que é mais além
RODRIGO GARCIA LOPES
Arizona, 1991
(Em Solarium, Iluminuras, 1994)
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