terça-feira, fevereiro 16, 2010

EDVALDO SANTANA EM SAMPA


Edvaldo Santana é um dos maiores artistas da MPB. Pouco valorizado e ouvido, na minha opinião, já não é de hoje que ele tem feito um dos trabalhos mais interessantes que estão rolando por aí. Quem não conhece não sabe o que está perdendo. E ele está lançando um novo disco. Faz show em Sampa dia 21, acompanhado de outras feras: Luiz Waack, Reinaldo Chulapa e Ricardo Garcia. Recomendo a quem estiver pela terra da garoa (?) ou do dilúvio.


segunda-feira, fevereiro 15, 2010

RIMBAUD SAMBOU NO CARNAVAL





DESFILE



Patifes sólidos. Muitos já exploram vossos mundos. Sem carências, e pouca pressa em aplicar suas brilhantes faculdades e sua experiência de vossas consciências. Que homens maduros! Olhos vidrados como noite de verão, vermelhos e negros, tricolores, aço salpicado de estrelas douradas; faces disformes, plúmbeas, pálidas, em brasa; rouquidões burlescas! os passos cruéis dos ouropéis! — Alguns são jovens, — mas como encarariam Querubim? — munidos de vozes medonhas e truques perigosos. São enviados amarrados pras cidades, fantasiados com um luxo que dá nojo. Oh! O mais violento Paraíso da careta furiosa! Nada comparável a seus Faquires e outra tantas teatrais bufoneiras. Em trajes improvisados com sabor de pesadelo, encenam litanias, tragédias de malandros e semideuses cheios de graça, como jamais foram a história ou as religiões. Chineses, Hotentotes, ciganos, otários, hienas, Moleques, velhas demências, demônios sinistros, misturam os modos populares, maternais, com poses e ternuras bestiais. Interpretariam peças novas, canções “para moças”. Mestres jograis, eles transformam o lugar e as pessoas, e usam a comédia magnética. Os olhos ardem, o sangue canta, ossos se dilatam, escorrem lágrimas e fitas de carmim. Sua folia ou seu terror dura um minuto, ou meses inteiros.


Só eu tenho a chave desse desfile selvagem.





ARTHUR RIMBAUD


(tradução de Rodrigo Garcia Lopes e Maurício Arruda Mendonça

em Iluminuras-Gravuras Coloridas (Editora Iluminuras, 1994)



sexta-feira, fevereiro 05, 2010

De "ESPAÇOS BRANCOS", poema em prosa de PAUL AUSTER


Alguma coisa acontece, e a partir do momento em que começa a acontecer, nada mais pode ser a mesma coisa.

Algo acontece. Ou melhor, algo não acontece. Um corpo se move. Ou melhor, não se move. E se ele se move, algo começa a acontecer. E mesmo que não se mova, alguma coisa começa a acontecer.

Isto vem de minha voz. Mas não quer dizer que essas palavras sempre serão o que acontece. Ela vem e vai. Se por acaso estou falando neste momento, é só porque espero achar um jeito de prosseguir, de correr paralelamente a tudo que está acontecendo, e assim começar a achar um jeito de preencher o silêncio sem despedaçá-lo.

Peço a quem quer que esteja ouvindo esta voz para esquecer as palavras que ela está falando. É importante que ninguém escute com muita atenção. Quero que essas palavras desapareçam, digamos, dentro do silêncio de onde vieram, e por nada permaneça apenas uma memória de suas presenças, um emblema para o fato de que um dia estiveram aqui e não estão mais aqui e que durante sua vida breve pareciam não estar dizendo nada muito particular como se ser a coisa que estava acontecendo ao mesmo tempo um certo corpo se movendo num certo espaço, que eles se moviam junto com tudo mais que se movia.

Algo acontece, e já não é mais começo, mas algo mais, nos propelindo dentro do coração da coisa que está acontecendo. Se fossemos de repente parar e nos perguntar, “Para aonde vamos?”, ou “Aonde estamos”, estaríamos perdidos, pois a cada momento não estamos mais aonde estávamos, mas deixamo-nos para trás, irrevogavelmente, num passado sem memória, um passado infinitamente esquecido por um movimento que nos carrega dentro do presente.

[...]

PAUL AUSTER

Tradução: Rodrigo Garcia Lopes