terça-feira, outubro 30, 2007

Um poema de LEMINSKI traduzido pro inglês



BEM NO FUNDO


no fundo, no fundo,
bem lá no fundo,
a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decreto

a partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela - silêncio perpétuo

extinto por lei todo remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada mais

mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
e aos domingos saem todos pra passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas



PAULO LEMINSKI

****

DEEP DOWN

deep down, deep down,
so very deep down,
we'd like
to see our problems
resolved by decree

from this day on,
that sorrow without remedy
is considered null
and in its place - perpetual silence

by law all remorse extinct,
damned be those who look back,
back there there is nothing,
and nothing more

but problems do not resolve themselves,
problems have a big family,
and on Sundays they all go for a stroll
mister problem, his mistress
and other tiny little problems




Traduzido por Rodrigo Garcia Lopes e Marco Alexandre de Oliveira



sábado, outubro 27, 2007

Alguns aforismas de EZRA POUND

EZRA POUND: AFORISMAS

Tradução: Rodrigo Garcia Lopes

*

Um homem que sabe realmente é capaz de dizer tudo em poucas palavras.

*

Um escravo é alguém que espera outra pessoa vir libertá-lo.

*

Um clássico não é um clássico porque se conformar a certas regras estruturais, ou se encaixar em certas definições (das quais o autor provavelmente nunca ouviu falar). É clássico porque possui um frescor determinado e irrepreensível.

*

A maioria dos escritores carece de caráter e não de inteligência.

*

A linguagem existe para servir o pensamento, não para ser preservada num museu.

*

Não há democracia nas artes.

*

A poesia é um tipo de matemática inspirada, que nos dá equações, não para figuras abstratas, triângulos, esferas, e coisas do tipo, mas equações para as emoções humanas.



quinta-feira, outubro 25, 2007

Entrevista com Ademir Assunção na Etcetera

Uma entrevista longa e muito legal que o Ademir Assunção deu no ano passado para a revista Etcetera, de Curitiba

http://www.revistaetcetera.com.br/17/ademir_entrevista/index.html

Orfanato Portátil

O amigo e poeta Marcelo Montenegro, da terra do glorioso azulão, está de volta com seu blog Orfanato Portátil:

http://marcelomontenegro.blog.uol.com.br/

Satori Uso em Barcelona e no Rio nesta sexta


O curta londrinense "Satori Uso", uma produção da Kinoarte com direção de Rodrigo Grota, será exibido nesta sexta em Barcelona e no Rio de Janeiro. Na Espanha, o filme será exibido no Espaço DAeDAlus (C/ Trafalgar, 48, interior 1º b) às 20h30, com entrada franca. Após a sessão, haverá um debate com a assistente de direção Mariana Soares. No Rio de Janeiro, o filme integra a Competição Nacional do Curta Cinema – Festival Internacional de Curtas Metragens do Rio de Janeiro nesta sexta, às 16h, no Cine Santa; e no domingo, dia 28, às 19h30, no Odeon – as duas sessões têm entrada franca. No último fim de semana, o filme inspirado na obra de Rodrigo Garcia Lopes recebeu uma menção honrosa na IV Mostra Curta Pará Cine Brasil. "Satori Uso" é uma realização da Kinoarte com patrocínio da Prefeitura de Londrina.

Tordesilhas em Sampa, Curitiba Literária e Coyote em Londrix




Vários eventos literários importantes aconteceram e continuam acontecendo em 2007 em Pindorama. Eles são importantes e vitais nestes tempos superficiais e massificantes, e reforçam a relevância da poesia como forma de conhecimento e também para a preservação da espécie.

Com participantes de vários países e curadoria de Claudio Daniel e Virna Teixeira, acontece dia 30 de outubro a 4 de novembro o Festival Tordesilhas, que se propõe a “apresentar e discutir a produção recente da poesia na América Latina e na Península Ibérica com a proposta de "desconstruir a linha de Tordesilhas", expressando a busca por novos diálogos entre artistas, acadêmicos, críticos e editores de poesia nas línguas portuguesa e espanhola.” Muitos nomes de qualidade e de peso, o que com certeza contribuirá pros debates e a riqueza das leituras. Oferecem a chance de entrar em contato com diferentes vozes e visões.


Mais informações no site:
Http://festivaltordesilhas.net


Na na terra das araucárias ocorre de 4 a 10 de novembro a Curitiba Literária 2007.



Em homenagem ao escritor Valêncio Xavier, a cidade realiza a 1ª edição do Curitiba literária. O objetivo é discutir a literatura, promovendo um diálogo direto com a população. No período, acontecerão encontros com escritores, mesas de discussão, oficinas de literatura, assim como espetáculos de teatro e música. Grande parte do evento acontecerá numa tenda-auditório montada na Praça Osório, onde haverá também uma Feira de Livros. Além disso, o Sesc Paraná realizará eventos como: exposição sobre a obra de Clarice Lispector, oficinas e outros. A abertura do Curitiba Literária será dia 04 de novembro, às 20h, na Ópera de Arame, com um show do Cordel do Fogo Encantado.

Parabéns para Luci Collin, Rogério Pereira e Paulo Sandrini, os curadores. Outro grande evento, que vai trazer nomes de peso da poesia mundial como Jerome Rothenberg.

Confira a ampla programação aqui:

http://curitibaliteraria.multiply.com/


E hoje tem lançamento em Londrina da Coyote número 15, que está comemorando cinco anos de existência. Boa sorte pro Maurício e Losnak!


quarta-feira, outubro 24, 2007

"Tudo no Espaço", poema de Visibilia (1996)




Tudo no espaço


É passado. O tempo,


pura distância,

lento azul profundo.


Mesmo a chuva

mais breve


cai neste mundo




Daniel Piza comenta "Ariel" em O estado de S. paulo

fonte: O Estado de São Paulo 14 de outubro de 2007

RODAPÉ (2)

Arte feita do drama autobiográfico foi também a da americana Sylvia Plath, cujo melhor livro de poemas, Ariel, acaba de ganhar ótima tradução de Rodrigo Garcia Lopes e Maria Cristina Lenz de Macedo (Verus Editora). O original em inglês é estampado em fac-símile dos manuscritos originais, digitados em máquina de escrever, e isso resulta num efeito interessante. Ler sua poesia é realmente como flagrar uns papéis na gaveta de uma mulher, como um diário íntimo elevado à condição de arte pela força de suas imagens (“Nada a fazer com este lindo vazio a não ser poli-lo”, “Eu me reviro em minha bainha de impossibilidades”) e um tom que, por mais deprimido, por mais cansativo de tão lúgubre, sempre soa como um pedido de salvamento.

segunda-feira, outubro 22, 2007

Resenha de "Ariel" na Folha de São Paulo




Crítica/"Ariel"
Edição mostra Sylvia Plath sem cortes

Lançamento traz os originais da coletânea "Ariel", datilografados pela poeta, sem supressões e inclusões do marido Ted Hughes

IVO BARROSO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Graças às revelações da crítica Marjorie Perloff, os cultores de Sylvia Plath já sabiam, desde 1990, que o livro, publicado em 1965 pelo marido Ted Hughes sob o título "Ariel", não era exatamente a reprodução dos originais datilografados que a autora deixara sobre a escrivaninha, em 1963, quando se suicidou aspirando gás de cozinha. Os poemas tinham sido remanejados por Ted, que os submetera a cortes e inclusões, para -segundo ele- "fazer do livro o melhor que pudesse" e, ao mesmo tempo, "defender a memória da mãe de seus filhos e de pessoas vivas, além da própria reputação".

Alguns dos poemas suprimidos deixavam à mostra a grande amargura de Sylvia com a traição do marido, que a abandonou por Assia Wevill, com quem ele teve uma filha. Esse ato de suposto escamoteio dos indícios de uma possível culpa fez com que a corrente feminista norte-americana o atacasse furiosamente, atribuindo-lhe a morte da esposa por indução ao suicídio (a palavra "assassinato" foi mesmo utilizada). Via-se nele apenas o poeta inglês conquistador que teve inúmeros casos com suas colegas e alunas do Pembroke College, em Cambridge, onde conheceu e se casou com Sylvia, que ali fora estudar graças a uma bolsa da Fundação Fullbright.

Essa fúria feminista agravou-se ainda mais quando, seis anos após a morte de Sylvia, a "outra" igualmente se suicidou com gás, depois de matar a filha Shura, que tivera de Hughes. À parte essa acusação pública de mau-caratismo, Ted era considerado pela crítica como o mais importante poeta inglês do século 20, e guardou o título de Poeta Laureado da Inglaterra de 1984 até sua morte, em 1988. Pouco antes de morrer, publicou uma coletânea de poemas, "Cartas de Aniversário" (ed. Record), em que relata seu relacionamento com Sylvia, desde o encontro inicial em Cambridge até a separação, conseguindo com isto granjear alguma simpatia em relação ao seu comportamento conjugal.

Originais verdadeiros


Contudo, foi só em 2004 que os mesmos cultores plathianos puderam ter acesso aos verdadeiros originais de "Ariel", na ordem estabelecida por Sylvia, sem cortes nem substituições. A filha do casal, Frieda Hughes, deu a público uma edição fac-similada dos originais cuidadosamente datilografados pela própria Sylvia, com todas as emendas à mão feitas por ela. O título original era inicialmente "Rival" (rival), emendado para "A Birthday Present" (um presente de aniversário), depois para "Daddy" (papai), para fixar-se finalmente em "Ariel", que, nas próprias indicações um tanto despistadoras fornecidas por Sylvia à BBC numa entrevista de 1962, tanto podia significar o personagem shakespeariano de "A Tempestade" quanto o nome de um cavalo de sua predileção.

Nesse prefácio, a filha Frieda, embora defendendo a integridade da obra materna, escusa o pai de ter desfigurado o livro, informando que ele fizera uma leitura crítica dos originais, retirado 13 poemas e os substituindo por trabalhos mais recentes e expressivos que Sylvia compusera nas últimas semanas antes de morrer. E Frieda ataca frontalmente os que acusaram Ted de ter agido em causa própria, dizendo: "Meu pai tinha profundo respeito pela obra de minha mãe, apesar de ter sido um dos alvos da fúria dela. A obra era tudo para ele, que via o cuidado com ela como uma forma de homenagem e uma responsabilidade".

Destoando do coro da crítica feminista anti-Hughes, a criteriosa Meghan O'Rourke publicou, logo após o aparecimento da edição fac-similada de 2004, um artigo em que analisa as alterações introduzidas por Ted, concluindo, com argumentos convincentes, que a versão dele "é de fato superior à de Plath -e que a própria [autora] teria ficado satisfeita com ela". Essa opinião, no entanto, não é incontestável.

Saindo agora a edição brasileira de "Ariel", vê-se que foi conservada a reprodução fac-similar dos originais datilografados de Sylvia Plath, vis-à-vis da tradução dos versos feita por Rodrigo Garcia Lopes e Maria Cristina Lenz de Macedo. Embora não esteja esclarecido o método utilizado pelos tradutores -uma espécie de execução musical seja a dois pianos ou a quatro mãos- a qualidade do trabalho de transposição (no livro mencionada como "transcriação") merece ser destacada, tendo em vista a riqueza vocabular, os efeitos guturais, sonoros, dessa poesia que, segundo a própria autora, ganhava intensidade ao ser lida em voz alta. Quem ouviu a gravação em cassete "The Poet Speaks" -em que T. S. Eliot lê um dos poemas humorísticos de "Os Gatos"- lembra-se da voz esganiçada e quase histérica de Sylvia dizendo "Daddy", dedicado ao pai entomologista "prussiano", Otto Plath, que ela perdeu aos oito anos e de cuja lembrança jamais conseguiu libertar-se, tanto assim que cogitou de dar a este seu livro o título do poema. Seu temperamento irritadiço e neurótico levava-a a constantes crises de depressão, mas foi sobretudo a ruptura com Ted que a fez escrever alguns de seus melhores versos, amargos e espinhosos, estrategicamente subtraídos por ele em sua edição de "Ariel".

A poesia de Sylvia é hermética, desnorteante às vezes, com o leitor sem saber o significado ou a intenção dos versos, mas sempre construída com um vocabulário de riqueza léxica incomparável, bem diversa da poesia do marido que, pelo menos nas "Cartas de Aniversário", assume um tom narrativo, facilmente decodificável.


IVO BARROSO é poeta, crítico e tradutor, autor de "A Caça Virtual" (ed. Record)


ARIEL
Autora: Sylvia Plath
Tradução: Rodrigo Garcia Lopes e Maria Cristina Lenz de Macedo
Editora: Verus
Quanto: R$ 34,90 (210 págs.)
Avaliação: ótimo

quarta-feira, outubro 17, 2007

A MILÉSIMA SEGUNDA NOITE (de Nômada, 2004)



Diferente de todos os seus antecessores, Al Nija trazia o terror entranhado em cada traço de sua persona: sua capacidade de sumir, assim, como quem nem. E reaparecer.

Ponderado em suas decisões, tomava de assalto o deserto de Sefira, queimava os portos de Kólophon. Tudo era signo. A tomada era lida como uma necessidade prevista no Livro, o incêndio uma ação preventiva, a decisão ela mesma uma miragem. Não importava que as provas fossem forjadas. Com o rosto de nuvens pisadas de sangue, aquilino olhar de mar morto, Al Nija se concentrava no único incidente daquela tarde digno de notícia: restos de fuselagem diabólica passando em câmera lenta sobre a muralha cruzando a moldura dos olhos. Trepanados anjos de metal trucidavam sua mente com o ódio a seus antecessores, aos séculos, e as memórias de Ishtar, o atentado em Ogirdor, a vitória em Kabal, a percepção na tomada de Basra, se misturavam como se fossem um único acontecimento. Al Nija sofria. Eram.

Reaparecido num canto de uma biblioteca pública no Cairo, transmutado num luxuoso volume de mapas chineses, Al Nija não parecia mais um homem. Longe disso. Quem o folheasse veria no que ele havia se transformado: um cenário. Pedras e vales, onde alguém veria um nariz. Céu de silk-screen, onde outrora seus gestos. Cavernas, oásis, no lugar de falo e olho. As traças telepáticas fizeram o resto, porque era preciso acionar a rede antes de sumir novamente, era preciso checar os dados de Hassan, o grande mestre. Este, mestre, tinha, assim como Al Nija, notável traço: quase não se percebia nada, distinguia um vazio de uma camuflagem, cartilagem muito bem urdida, camuflagem essa que fosse o próprio real. Invisível. O ataque era sempre certeiro. As gravações eram feitas sempre antes dos eventos, o que poupava um tempo. Nisso eram especialistas, os dois, sim, porque em tempos não se distinguia mais Hassan de Nija, Nija de Hassan. Assim, recém, eram espelhos que se matavam com seus reflexos infinitos.

Reaparecido numa traça telepática em Kólophon, sobre a cartilagem da muralha das memórias de Basra, com o rosto biblioteca de nuvens silk-screen e feição de caverna chinesa, Nissan se concentrava num volume trucidado de ação preventiva, fuselagens de sangue e o terror de sua capacidade de cenário, voltar a ser o próprio branco em seu deserto, a camuflagem de seu signo e sangue, diferente de todos os seus reflexos infinitos.





Rodrigo Garcia Lopes (de Nômada, 2004)

quarta-feira, outubro 10, 2007

De "Unearth" ("Desterra"), de PAUL AUSTER



1


Junto com tuas cinzas, quase nem sendo

escritas, obliterando

a ode, as raízes excitadas, o olho

forasteirocom mãos imbecis, te arrastaram

pra cidade, amarraram nesse

de gíria, sem te dar

nada. Tua tinta aprendeu

a violência do muro. Exilada,

mas sempre no coração

do sossego, teu irmão, mendigas as pedras

da terra invisível, e alisas seu lugar

entre os lobos. Cada sílaba

é um trabalho de sabotagem.



1



Along with your ashes, the barely

written ones, obliterating

the ode, the incited roots, the alien

eye — with imbecilic hands, they dragged you

into the city, bound you in

this knot of slang, and gave you

nothing. Your ink has learned

the violence of the wall. Banished,

but always to the heart

of brothering quiet, you cant the stones

of unseen earth, and smooth your place

among the wolves. Each syllable

is the work of sabotage.



PAUL AUSTER

De Unearth (1970-1972)

Tradução: Rodrigo Garcia Lopes

quarta-feira, outubro 03, 2007

MARCIAL


Marcus Valerius Martialis nasceu em Bilbao, Espanha, em 1 de março de 40 D.C. por volta do ano de 64 D.C.,tomou o rumo de todos os jovens da época que buscavam fama: Roma. Nessa época já fazia poesia, influenciado principalmente por Ovídio, Calímaco e Catulo. A vida inteira dependeu da grana de seus amigos ricos e de mecenas. Apesar de comum na época, o mecenato contribuiu para "sujar" ainda mais a sua imagem nos séculos seguintes. Seu primeiro livro, "Liber de Spectaculis", foi encomendado por ninguém menos que Nero possivelmente para festejar a inauguração de uma obra faraônica: o Coliseu, em 80 D.C. Marcial registra em seus epigramas a vida exagerada e luxuriante dos romanos, com requintes de sadismo, cenas de sexo explícito, e sem meias palavras. Uma de suas máximas era o célebre dito de Horácio: "carpe diem" (curta o dia). Marcial sempre aconselhava seus amigos a não levar a vida muito a sério. Humor, crítica social corrosiva, concisão: esses os elementos básicos de seus epigramas. (RGL)

* * *

Hic est quem legis ille, quem requiris,
toto notus in orbe Martialis
argutis epigrammaton libellis:
cui, lector studiose, quod dedisti
viventi decus atque sentienti,
rari post cineres habent poetae.



O autor deste livro que você lê
todo mundo sabe: é Marcial,
arguto epigramatista inimitável:
Valeu, meus fãs, por me darem
a fama imparcial que raros poetas
Mereceram enquanto vivos, como eu.

*

Quid mihi reddat ager quaeris, Line, Nomentanus?
Hoc mihi reddit ager: te, Line, non video.

Qual a vantagem, Lino, de viver em outro lugar?
A maior de todas é esta, Lino: não ter que te cruzar.

*

Veientana mihi misces, ubi Massica potas:
olfacere haec malo pocula quam biberi.

Você bebe o melhor vinho, e nos oferece o pior:
prefiro cheirar seu copo que beber do meu.

*
Scribere me quereris, Velox, epigrammata longa.
Ipse nihil scribes: tu breviora facis


Você diz, belo, que meus poemas são longos, não?
Você não escreve nada: isto é concisão?



Omnia promittis cum tota nocte bibiste;
mane nihil prestas. Pollio, mane bibe.

De noite, bebum, promete o mundo,
De dia já esqueceu tudo. Meu bem, beba só de manhã.

*

Inscripsit tumulis septem scelerata uirorum
se FECISSE Chloe. Quid pote simplicius?

Nos setes túmulos dos seus sete maridos
ela deixou escrito: OBRA DE CLÔ.
Pô: como pode ser mais simples?

*

Cum sexaginta Cascellius annos,
ingeniosus homo est: quando disertus erit?

Aos 60 anos, Cacélio tem obra,
Ele promete: Ah é? Quanto ele cobra?

*

Volt, non volt dare Galla mihi, nec dicere possum,
quod volt et non volt, quid sibi Galla velit.

Vai dar dar ou não vai dar? Gala não diz:
o que se passa na cabeça dessa meretriz?

*

Thais habet nigros, niveos Caecania dentes.
quae retio? emptos haec habet, illa suos.

Os dentes de Taís são negros; os de Lacânia, um marfim.
“E o que que tem?” “Lacânia comprou-os ontem”.

*

Et uoltu poteram tuo carere
et collo manibusque cruribusque
et mammis natibusque clunibusque,
et, ne singula persequi laborem,
tota te poteram, Chloe, carere.

Isso, leva tua cara, leva teu cu,
pescoço, leva teus braços, leva tuas
ancas, tua bunda, tuas tetas.
E, antes que eu me esqueça,
Clô, leva você também.

*

Audieris in quo, Flacce, balneo plausum,
Maronis illic esse mentulam scito.

Vindos da sauna, uivos, aplausos, risos:
A pica de Marino é o motivo.

*

Pulchre valet Charinus et tamen pallet
parce bibit Charinus et tamen pallet.
bene concoquit Charinus et tamen pallet.
sole utitur Charinus et tamen pallet.
tingit cutem Charinus et tamen pallet.
cunnum Charinus lingit et tamen pallet.

Carino tem saúde e continua pálido.
Carino enche a cara e continua pálido.
Carino pega sol e continua pálido.
Carino enche a pança e continua pálido.
Carino se maquia e continua pálido.
Carino lambe cu e continua pálido.

*

Miraris veteres, Vacerra, solos,
Nec laudas nisi mortuos poetas
Ignoscas petimus, Vacerra: tanti
Non est, ut placeam tibi, perire.

Você, Vacerra, incensa só poetas
mortos. Seu elogio não me assusta.
Não vale a pena morrer por você,
seu filho da puta.




Tradução: Rodrigo Garcia Lopes